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quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Um convite, um poço, um nome...

Entre choros, risos, cascas de frutas, garrafas vazias,
roupas no chão,
rabiscos, sussurros, crenças,
pés na grama,
medos, piadas, cabeçadas, sonhos, feridas, band-aids,
mãos abertas,
crianças, cachorros, gritos, rotinas, sinais, encruzilhadas.

Vejo o Coelho Branco correndo, atrasado!?

Vou, sim vou atrás dele. Foge comigo?

O poço nos espera...

"Queria poder te chamar pelo nome, (e esse não poder me deixa péssimo), mas te chamo apenas de :

- Meiguice!!!"

terça-feira, 26 de dezembro de 2006

Las cucarachas

Enquanto estou a pensar,
nas coisas de uma vida de homem,
Dívidas, penitências, medos e desejos,
vejo duas baratas à baratear,
( andar sem caminho, sem se preocupar)

(Inveja!!!)
Por não poder seguir assim,
tão leve.

(Inveja!!!)
Nós,
sempre vivendo para coisas, para outros,
sempre com uma falta de ar.

As baratas dançam e cantam " I will survive"
sim, elas sempre vivem e viverão,
por viverem com tão pouco

Ser humano é difícil,
Vida de Homem sai caro,
Vida de barata, é barata mesmo.

segunda-feira, 25 de dezembro de 2006

Ene-a-o-til



- Não. Não dá mais – ele disse.

Então o seu mundo caiu, as estrelas se apagaram e a chuva pareceu mais forte. Não houve dialogo, tudo o que ela tinha a dizer, ficou preso em sua garganta, um coração na boca.
Ele se foi. Ela saiu caminhando para casa, com um passo lento e doído.

- Talvez fosse melhor ficar parada na rua e um carro vir e acabar com tudo - pensou ela.

Tudo bem, bem que ela tentou, imóvel, a dois passos do meio-fio esperando o choque, viu o ônibus se aproximando, não se mexeu, cada vez mais perto, mas ele parou, abriu as portas, sorte ou azar ela havia parado, uns 10 metros à frente de uma parada de ônibus.

- Aff, nem isso eu consigo - pensou ela.

O jeito então foi continuar seu caminho. Não, não, não, a palavra ainda ecoava em seu ouvido. Com sua imaginação do mundo de Bob, ela poderia imaginar um milhão de possíveis motivos, mas porque fazer isto? Nada adiantaria.
Mas sem precisar mandar sua cabeça começou a relembrar alguns dos nãos que ela já havia tomado na vida.

- Mãe compra sorvete?
- Não.
- Pai me compra uma Barbie?
- Não.
- Professora será que posso entregar depois?
- Não.
- Posso dormir fora hoje?
- Não.

Uma vida feita de nãos. Mas pensando melhor, ela pôde perceber que os nãos haviam colocado limites a seus desejos e caprichos, era uma tesoura a de quando em quando cortar a ponta de suas asas, não foi tão ruim assim, não foi mesmo, só de imaginar de quantas desventuras ela já deveria ter escapado por ouvir um não, e alias isso nunca havia a privado de sonhar e realizar alguns de seus sonhos.
Se tivesse esse poder, esse poder de dizer não, teria tomado melhores atitudes, e evitado várias gafes e armadilhas.

- Filha come essa sopa de brócolis.
- Coloca esse vestido cor de rosa para ir a festa.
- Ah querida. Você sabe que eu te amo, não sabe?

Não, não, não, mil vezes não. A chuva continuava caindo, seus passos mais leves, ela ia agora de cabeça erguida, disposta a ouvir mais um não, e melhor, disposta a dizer quantos não ela tiver vontade de dizer.
E quando chegou em casa, suspirou, guardou seu coração no bolso, e se surpreendeu ao olhar no espelho. Cabelo, rosto todo molhado, de chuva e lágrimas, mas um sorriso largo de dar orgulho.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

Fazendo as pazes


Com um jeito tímido, sem saber com que cara, foi entrando na igreja.

- Há quanto tempo...- pensou ele quando cruzou pela porta.

Na correria diária, ir a igreja parecia algo supérfluo, às vezes sem sentido, mas agora era diferente. Era segunda-feira, havia poucas pessoas na igreja, todas perto do altar, rezavam juntas, de longe ele observava sem vontade de se aproximar. Ele queria mesmo era falar com o padre, pedir um conselho, talvez se confessar.

Mas com vergonha procurou um banco afastado do altar e se sentou, não era muito confortável mas servia. Com a cabeça baixa, entre as mãos ele ficou, tinha tantos problemas para pensar, sua cabeça pesava.

Na verdade não problemas, mas dívidas. Dívida com sua mãe, com sua avó, irmão, e com as pessoas que sabia que amava e nunca havia demonstrado tal sentimento. Dívidas de amor, as piores.

Poderia ficar ali por horas, mas não, a Vida não deixa ninguém se esconder por muito tempo.

- Garoto, o que você tem?- perguntou um senhor.

Careca brilhante, um pouco de cabelo grisalho, segurava uma boina na mão, aparentava ter uns 60 anos de idade, falava de forma suave, trazia confiança.

- Problemas, problemas...

- Ah, que ótimo. Adoro problemas.

- Ah, tá sei! Isso quando não são seus.

- Que isso, gosto deles mesmo, principalmente quando são meus.

- Não entendo. Como pode alguém gostar de ter problemas?

- Simples. Sem problemas, eu me sinto velho. Sinto que a morte pode estar chegando logo ali, porque possuir problemas me faz me sentir vivo, como um garoto.

- Hum...

- Problemas de amor?

- Sim, sim.

- Hum, esses não podem esperar. Eu perdi muitos amores,perdi minha esposa, meus pais, meus filhos, amei demais, mas sinto que não foi o bastante. Nunca é o bastante.

- Que pena. Mas não sei o que, nem como fazer.

- Vá, se abra, deixe que o amor fale por você. Todos sabemos amar, nossa cabeça é que às vezes atrapalha, o tempo de amar é sempre o Agora...


Tum... Tum... Tum... e mais seis badaladas, eram nove horas.

Levantou a cabeça, assustado, havia dormido. Uma dor no pescoço por causa do mau jeito, se espreguiçou, se sentiu confuso.
A igreja agora estava tão silenciosa, havia apenas duas mulheres ajoelhadas, apoiadas no encosto do banco mais próximo do altar.
Onde estaria aquele senhor? Havia mesmo recebido conselhos dele? Ou foi apenas um sonho? Não soube responder.
Mas dentro dele agora havia uma força tão grande, esqueceu de suas vergonhas, medos, já sabia o que fazer. Era tempo de amar.

E foi-se. Sem rezar, sem se confessar, sem dizer amém, havia feito as pazes com Deus.

Alice através do espelho



Alice olha no espelho, batom, lápis, delineador, perfume, um risinho, está pronta. Mais uma vez vai se jogar na noite, novos rostos, novos lábios, tentando encontrar em outros o que não encontra naquela que vê no espelho. Ela, a mais popular, a mais cheia de amigos, a mais desejada por homens e mulheres.
Na procura de mais uma baladinha, tentando achar um pouco de felicidade no fundo de um copo, ela só consegue ver a vida um pouco mais distorcida do que realmente é.

- Quem é que vai dormir com ela essa noite?

O nome ela ainda não sabe.

- Quem vai ligar para ela no dia seguinte? Para quem ela vai chorar suas dores?

Para isso não há resposta.

É existe um preço a pagar, por se ter uma vida mais efervescente do que sal de frutas Eno.
Procura as chaves, fecha a porta, então corredor.
– Ei. Segura o elevador aí.
Então rua, noite, porta de barzinho, falação, azaração, pegação.

Só mais uma noite, que talvez a faça pensar porque estando com todos, ela ainda se sente tão sozinha, é fácil achar alguém para preencher seu corpo, mas seu coração é uma cidade fantasma.

Volta para casa, não deita sozinha, dedos a percorrem, o corpo treme, então chega, ela esquece tudo a sua volta, medos, carências, problemas, e adormece feliz.

Alice levanta só, e com seu ursinho, vai até o espelho, maquiagem borrada, cara cansada, atrás dessa imagem uma criança triste que precisa de atenção e respeito, e pouco a pouco o reflexo vai ficando distorcido pelos olhos molhados e os soluços. Talvez usar o sexo como escambo, não traga um amor para toda vida, ela a mais mentirosa e solitária.

A luxúria pode ser uma máscara bela, mas pouco a pouco escorrega e revela um rosto despedaçado, cheio de sorrisos forçados que fazem doer às bochechas, numa automutilação silenciosa e fugaz.
E o espelho se quebra.

domingo, 17 de dezembro de 2006

Um amor infinito

Ele a abraçou, disse coisas no ouvido, beijou seus lábios, e então grudaram os corpos. Suspiros, o ar entrando e saindo de forma rápida de um a outro, o tato inflama e os sentidos dizem coisas sem usar palavras, ficaram assim por um tempo, um tempo que o relógio não contou. Depois sem tchaus, sem adeus, se foram. E para o Amanhã só deixaram um talvez...

Portas e janelas

Depois de mais um dia difícil, trabalho sim, sim houve e haverá muito trabalho, problemas em casa, um corpo cansado e um vazio no coração.
Ela sobe as escadas devagar, um lance, dois, três andares, ela não foi vista por ninguém, mais cinco andares, empurra, a porta abre rangendo, ela chegou, o vento bate em seu rosto, ela fingi não sentir, sim e ela faz isso bem. Vinte passos depois, ela olha o mundo lá embaixo, com olhos molhados, vê pessoas pequenas, carros apressados, sem piscar ela pensa em ver tudo agora mesmo mais de perto, o vento a chama, mas não, não, não. Ela se vira, enxuga as lágrimas, devagar vai para casa, desmanchar o altar que fez a suas feridas, abre as portas e janelas e dá mais uma chance a sorte da Vida.

Vai ver é assim mesmo


Andando rápido com seu All Star, Tiago desce as escadas. Estação da Sé, tanta gente indo, vindo, para todos os lados. No ouvido fone, mp3, tocava alto "Vai ver é assim mesmo" do Dance of Days.

“Sabe eu cansei de estar aqui esperando, mas não sei se...”.

Cabisbaixo, ele vai entre a multidão, não presta atenção em ninguém só quer um espaço. Um rosto conhecido era Aline, o coração bateu depressa até ver o cara mais velho que estava ao lado, era mais um.

“Quanto te vejo correr de lábio a lábio pelos...”.

Ele suspirou e andou sem olhar até perto da linha amarela de segurança, não havia nada que ele pudesse fazer, apenas sofrer mais uma vez.

“O amor é um demônio desgraçado que vive a me passar rasteiras...”.

O metrô se aproximava, Tiago ficou a espera, Aline passava os olhos entre os rostos porque viu o brilho dos olhos dele. As portas se abriram, o empurra-empurra de sempre, Aline foi até perto do vagão onde Tiago entrou, lá dentro não o encontrou, na plataforma ele não ficou, só houve um barulho, quando o metrô partiu.

“Talvez tudo mesmo seja a maneira que eu encontrei pra acabar com meus dias...”.

Tiago não sofreu mais por Aline, e ela chorando, correu aos braços do cara mais velho, que era seu pai...

Lembrar é bom, esquecer pode ser melhor

Barulho no telhado de zinco, correndo os olhos pela janela, ela vê grandes gotas de chuva caírem no solo que as recebe de bom grado.

- Eita menina! Como vai embora agora?- grita a patroa.
- Eu... Bem eu não sei não, dona.
- Menina esquecida, nunca escuta que se deve andar sempre com sombrinha?
- Sim, eu sei, mas...

Ela então vai, o vestido, os cabelos e o corpo, a molhar com a chuva de verão. Na esquina, próxima a sua casa, uma calçada com azulejos, escorregão, corpo ao chão. Dolorida e com vergonha, levanta devagar, uma mão, não uma não, mas duas mãos a ajudar, e dois olhos brilhantes, que ela só pensava que existisse nos seus sonhos e quando lia as histórias de amor vendidas em banca de jornal.

- Você se machucou? disse o dono dos olhos.
- Não, não foi nada.- ela disse.
- Não, foi tudo, o Tudo e o mais – foi o que ela sentiu.

Essa menina esquecida, nesse dia aparentemente comum, não imaginava encontrar o amor de sua vida, e sua Avó não imaginava a dádiva que sua neta teria, ao esquecer mais uma vez de suas palavras.

- Ai fia, leva a sombrinha que vai chover!