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quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

Alice através do espelho



Alice olha no espelho, batom, lápis, delineador, perfume, um risinho, está pronta. Mais uma vez vai se jogar na noite, novos rostos, novos lábios, tentando encontrar em outros o que não encontra naquela que vê no espelho. Ela, a mais popular, a mais cheia de amigos, a mais desejada por homens e mulheres.
Na procura de mais uma baladinha, tentando achar um pouco de felicidade no fundo de um copo, ela só consegue ver a vida um pouco mais distorcida do que realmente é.

- Quem é que vai dormir com ela essa noite?

O nome ela ainda não sabe.

- Quem vai ligar para ela no dia seguinte? Para quem ela vai chorar suas dores?

Para isso não há resposta.

É existe um preço a pagar, por se ter uma vida mais efervescente do que sal de frutas Eno.
Procura as chaves, fecha a porta, então corredor.
– Ei. Segura o elevador aí.
Então rua, noite, porta de barzinho, falação, azaração, pegação.

Só mais uma noite, que talvez a faça pensar porque estando com todos, ela ainda se sente tão sozinha, é fácil achar alguém para preencher seu corpo, mas seu coração é uma cidade fantasma.

Volta para casa, não deita sozinha, dedos a percorrem, o corpo treme, então chega, ela esquece tudo a sua volta, medos, carências, problemas, e adormece feliz.

Alice levanta só, e com seu ursinho, vai até o espelho, maquiagem borrada, cara cansada, atrás dessa imagem uma criança triste que precisa de atenção e respeito, e pouco a pouco o reflexo vai ficando distorcido pelos olhos molhados e os soluços. Talvez usar o sexo como escambo, não traga um amor para toda vida, ela a mais mentirosa e solitária.

A luxúria pode ser uma máscara bela, mas pouco a pouco escorrega e revela um rosto despedaçado, cheio de sorrisos forçados que fazem doer às bochechas, numa automutilação silenciosa e fugaz.
E o espelho se quebra.

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